quinta-feira, 5 de junho de 2008

Desarranjo

Dois pedaços desse doce e a boca já ficou amarga. E não foi amargo de doce - o que seria uma indiscrição sem tamanho - mas pareceu de dia.

De dia não: de momentos.

O que me permitiu sentir o cheiro acre na amargura do doce foi, já me lembro, a falta do passado. Daquele em que o sabor pouco importava, cheiro ainda menos. Daquele em que pedaços pequenos de pedrinhas passavam despercebidos pela boca quando o que se tinha era mais feijão (nada doce, mas bom).

Mas, esqueçamos o passado. Me diz, sente também essa amargura? Porque, pensei, poderia ser amargura de beijo, daqueles que pouco se importam se duram ou não. Ou mesmo, amargura de sonho, daqueles que já foram tão bonitos, mas que hoje, se falado, viram pesadelos.

É, eu sei. O tempo muda, a gente muda. Mas não é dessa mudança assim sofrida que falo. É do tipo amargo, acre e doce. Assim, mistura inaliável, mas que sentida como o mais forte dos sabores, cheiros e tudo mais a que se possa juntar de modo a ter sinestesia completa - se é que existe.

Em verdade, nada poderia ser passageiro - até o dia de hoje. E passou assim como se fossem dias. Mudanças e desmudanças. Mas, no fim, ruim.

Sentimento ruim.

A intenção não era amargar de tudo o gosto, mas conseguiu. Três palavras e meia e tudo mais desceria rio abaixo.

Não foi o dia ruim. Foram os momentos.