sexta-feira, 5 de abril de 2019

Aprendendo a ler

Eu não nasci ontem, foi meu corpo quem se descobriu. Ainda um pouco distraído, sem muito jeito pro peso que carregava, cambaleou e tremeu. Mas a voz que vinha de fora dizia: não cai, porque você não veio colada ao solo. Você é também ele.

De alguma maneira, o corpo já sabia onde estava o apoio e sorriu. Um sorriso forte, um brado. Dava pra sentir o calor, uma chama que queimava de dentro, mas não ardia. Era um acalanto leve e dissipador da névoa. Não tinha vento, mas sim arrepio. Um zumbido leve, como quem está submerso e atento. De alguma maneira, era um corpo aninhado pela água e pelo fogo. Um corpo tranquilo, sem apuros nem receio do vazio.

Uma descoberta bonita, que reabriu porteiras esquecidas no passado e mostrou que o perigo não estava além. Existe sim um horizonte ainda a ser alcançado... Mas o caminho não é solitário nem perigoso: é uma mata viva, que precisa de cuidado pra ser aberta, pois é um sistema de todos nós. Cada caminho que traçamos requer uma reorganização dos outros já abertos. Tudo é possível, só precisamos entender os fundamentos de cada passo.

Houve tempos em que eu só acreditava na verdade e na mentira. Arrebatamento era necessário para saber que o sentido era real e a desilusão precisava ser profunda para entender que a negativa estava ali. Como na pele eu nunca tinha sentido realmente a dor dos extremos, fui levando incrédula a mediocridade do tudo entender. Muitas certezas vieram e se acomodaram, na ilusão de fortaleza e sabedoria. Ontem mesmo todas as certezas se moveram e o que restou foi vapor, que não cabe entre os dedos e pede para ser dividido, mas é sempre presente e se faz ver.

E agora o hoje parece realmente ser o mais importante dos tempos, pois ele vem com um respeito grande ao ontem e uma admiração gigante ao amanhã. No entanto, não os quer ser. É firme e presente. É o que me faz pertencer e querer... pra ensinar meus camaradas.




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